15.4.13

O Bicho (Manuel Bandeira) *

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.




Depois de ler uma postagem no facebook de uma cidadã bem intencionada, solicitando policiamento na orla de João Pessoa, fiquei muito angustiada e com um nó na garganta daqueles que tiram até a fome. Tá ligado qual é, né? 

No texto, ela falava do que acontecia na orla e citava os "viciados" que "cheirando cola, fumando craque, bebendo, fazendo necessidades a luz do dia, dormindo no chão, tendo relações sexuais"  tiram o sossego dos cidadãos de bem que frequentam aquela área. Concordo demais que isso é ruim de se ver. Ruim pra nós, e ainda mais aos turistas, a quem parece que devemos maquiar a realidade pra dar a impressão que a nossa cidade é o lugar ideal de se viver. Sem a maquiagem não é possível falar pra eles:  "Eu moro onde você passa férias", não é mesmo, cidadãos pessoenses? 

Mas será que o policiamento vai resolver o problema ou vai apenas "limpar" a área e transferir os "indesejados moradores de rua" a outro local menos visível? Será que a maneira de se resolver é voltando às propostas higienistas do final do século XIX, em que as pessoas fora do padrão da sociedade iam parar nas periferias da cidade, sempre longe, bem looonge dos olhos daqueles "homens de bem" que não querem se comprometer nem sair do comodismo da era facebook. Eu reclamo, eu compartilho, mas eu continuo votando em quem vai me trazer benefício. Não é bem assim que fazemos?




Outro ponto citado no texto que me fez perder a graça, foi  quando ela afirmou que "estas mesmas pessoas estavam maltratando dois cachorros com socos, tapas, pontapés(...) colocando um cachorro contra o outro como se fosse uma rinha de galo". Sinto muito pelos cachorros. Não venho defender quem maltrata animais, mas a droga faz o homem virar bicho mesmo.  Mas o que sinto muito mesmo é por todos aqueles que não tiveram a oportunidade de ver o carinho com que muitos "moradores de rua" tratam seus animais e, mesmo sem ter nada pra oferecer de material, oferecem aquilo que (graças a Deus) é gratuito: amor e atenção. É difícil acreditar que tem irmão que mora na rua e, apesar de ter ninguém por eles, tem um cachorro pra lhe fazer companhia. E essa fidelidade é a coisa mais bela de se ver. 

É, no mínimo, contraditório nos preocuparmos com os cachorros, mas querer que só o governo se preocupe com os seres humanos que moram na rua. 

Na minha opinião, o que falta não é policiamento, mas tratamento. Viciados não precisam de cadeia, mas de remédio e de amor. Enquanto só nos indignarmos com o que 'enfeia' a cidade, e só ligarmos pra embelezar nossos corpos e casas, o mundo vai continuar igualzinho. COM ou SEM posto policial.. 


* Vale ver:
http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=p36kC5yiGp0#!
Video de Bruno Camurati, músico e compositor católico. (De onde tirei a poesia de Manuel Bandeira.)

E a foto não sei de quem é, mas foi retirada do: http://esperancaeluz.wordpress.com/2012/05/

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